Certa vez estava a falar com uma amiga minha. Era uma amiga relativamente recente, mas com quem eu já tinha algum à vontade na altura - uma pessoa reservada e introspectiva.De repente ela vira-se, e em resposta a um dos meus célebres "porquê?" ela responde-me: "porque me intimidas- e bastante!".
Aquilo apanhou-me de surpresa - afinal, intimido as pessoas? eeeeuuuu? E ao ponto de uma pessoa reservada mo dizer na cara?
Pus-me então a pensar em diversos amigos e cheguei à conclusão que se calhar intimidava mais gente - e nunca tinha percebido! Que eu intimidava as pessoas foi algo que me surpreendeu - pensar que nunca o tinha percebido irritou-me bastante (mais uma nota negativa mental para mim próprio).
Hoje incluí esse factor na minha análise das pessoas que me rodeiam. Comecei a tentar perceber que tipo de pessoas é que eu poderei fazer isso. Não mudei o meu comportamento, mas aprendi a (tentar) perceber quando é que acontece, e a (tentar) evitar levar isso a um ponto tal que possa tornar-se desconfortável para o "intimidado". Por outro lado passei a contar com essa possibilidade no meu "arsenal" - por vezes pode ser útil intimidar alguém numa situação (embora seja uma "técnica" que eu não goste de seguir).
Fiquei contente por mo terem dito. Serviu para me pôr no lugar, de forma a que valorizasse melhor a extensão da minha ignorância sobre os outros.
Serviu também para me pôr a pensar: afinal, o que mais é que farei aos outros sem que me aperceba?
Sunday, November 18, 2007
Wednesday, November 14, 2007
Aborto: Ordem dos Médicos não muda código deontológico
Ocasionalmente vejo notícias que me chocam tanto que me vejo obrigado a chatear-vos com estes posts políticos.
Esta li-a em dois sítios, com duas perspectivas ligeiramente diferentes. Uma delas está aqui:
http://dn.sapo.pt/2007/10/18/sociedade/pgr_obriga_medicos_a_mudar_codigo_ab.html
e outra aqui:
http://ultimahora.publico.clix.pt/noticia.aspx?id=1310672
Basicamente (segundo a minha leitura) o ministro da saúde pediu à ordem dos médicos para mudar o código deontológico, de forma a que os médicos possam cumprir a lei e efectuar abortos em algumas condições - não só a lei resultante do último referendo, mas também a lei de 1984 que prevê a possibilidade de aborto nos casos de violação, malformações do feto e outras situações excepcionais. Acontece que o código deontológico da ordem dos médicos diz frontalmente que os médicos não podem fazer abortos e a ordem dos médicos não pretende mudar esta situação.
O que acontece é que temos uma lei que permite uma acção, mas por outro lado temos uma organização que consegue efectivamente proibir todas as pessoas que podem cumprir a lei de o fazer - anulando assim a decisão da maioria.
Apesar de todos os defeitos que a democracia tem, é num estado democrático em que vivemos. Tal como eu tive que concordar com a condenação (à luz da lei de então) de algumas ex-grávidas que tinham abortado - mesmo depois de ter votado pela despenalização no primeiro referendo - estou à espera que as pessoas que não concordem com a lei actual não a quebrem - podem não concordar, mas têm que viver com ela.
Existe um segundo ponto no meio disto que parece estar a passar um pouco mais despercebido, mas que acho bastante importante - aparentemente também a objecção de consciência por parte dos médicos está a ser posta em causa.
Aqui já sou de opinião que cada médico deve ser capaz de se recusar a fazer algo com que não concorda. A diferença é que se um médico diz que não faz, posso sempre procurar outro - enquanto que se a ordem dos médicos diz que nenhum médico pode fazer, então não há volta a dar que não passe por uma grávida ir a um país estrangeiro...
Estou curioso em ver no que é que isto vai dar. O lobby dos médicos é muito forte, mas uma verdadeira democracia não se pode tornar refém de uma minoria - o que acontece mais vezes do que seria desejável.
Esta li-a em dois sítios, com duas perspectivas ligeiramente diferentes. Uma delas está aqui:
http://dn.sapo.pt/2007/10/18/sociedade/pgr_obriga_medicos_a_mudar_codigo_ab.html
e outra aqui:
http://ultimahora.publico.clix.pt/noticia.aspx?id=1310672
Basicamente (segundo a minha leitura) o ministro da saúde pediu à ordem dos médicos para mudar o código deontológico, de forma a que os médicos possam cumprir a lei e efectuar abortos em algumas condições - não só a lei resultante do último referendo, mas também a lei de 1984 que prevê a possibilidade de aborto nos casos de violação, malformações do feto e outras situações excepcionais. Acontece que o código deontológico da ordem dos médicos diz frontalmente que os médicos não podem fazer abortos e a ordem dos médicos não pretende mudar esta situação.
O que acontece é que temos uma lei que permite uma acção, mas por outro lado temos uma organização que consegue efectivamente proibir todas as pessoas que podem cumprir a lei de o fazer - anulando assim a decisão da maioria.
Apesar de todos os defeitos que a democracia tem, é num estado democrático em que vivemos. Tal como eu tive que concordar com a condenação (à luz da lei de então) de algumas ex-grávidas que tinham abortado - mesmo depois de ter votado pela despenalização no primeiro referendo - estou à espera que as pessoas que não concordem com a lei actual não a quebrem - podem não concordar, mas têm que viver com ela.
Existe um segundo ponto no meio disto que parece estar a passar um pouco mais despercebido, mas que acho bastante importante - aparentemente também a objecção de consciência por parte dos médicos está a ser posta em causa.
Aqui já sou de opinião que cada médico deve ser capaz de se recusar a fazer algo com que não concorda. A diferença é que se um médico diz que não faz, posso sempre procurar outro - enquanto que se a ordem dos médicos diz que nenhum médico pode fazer, então não há volta a dar que não passe por uma grávida ir a um país estrangeiro...
Estou curioso em ver no que é que isto vai dar. O lobby dos médicos é muito forte, mas uma verdadeira democracia não se pode tornar refém de uma minoria - o que acontece mais vezes do que seria desejável.
Monday, November 12, 2007
Medo da minha opinião?
Já não é a primeira vez que isto me acontece: alguém me convida para alguma coisa - por exemplo uma ida ao cinema ou ao teatro. No fim, o "anfitrião" pergunta-me o que é que eu achei. Quando eu respondo que gostei noto um certo (grande) alívio na pessoa.
O que eu acho estranho nesta reacção é que o facto de notar alívio em vez de alegria - parece que a pessoa estava com medo do que eu pudesse dizer.
Ainda não percebi bem este mecanismo, e se bem que por um lado gosto de sentir que a minha opinião é valorizada pelas outras pessoas, por outro preocupa-me este medo da minha opinião.
Fico sempre a pensar na quantidade de situações em que as pessoas me evitam só para não a ouvir...
Ainda ninguém me soube explicar este fenómeno - mesmo as pessoas a quem pergunto quando noto que isto acontece dão-me respostas incompletas ou pouco esclarecedoras - fico sempre a pensar que temem o que posso vir a dizer se me disserem a verdade sobre este tema...
O que eu acho estranho nesta reacção é que o facto de notar alívio em vez de alegria - parece que a pessoa estava com medo do que eu pudesse dizer.
Ainda não percebi bem este mecanismo, e se bem que por um lado gosto de sentir que a minha opinião é valorizada pelas outras pessoas, por outro preocupa-me este medo da minha opinião.
Fico sempre a pensar na quantidade de situações em que as pessoas me evitam só para não a ouvir...
Ainda ninguém me soube explicar este fenómeno - mesmo as pessoas a quem pergunto quando noto que isto acontece dão-me respostas incompletas ou pouco esclarecedoras - fico sempre a pensar que temem o que posso vir a dizer se me disserem a verdade sobre este tema...
Wednesday, November 7, 2007
Crescer é...
...perceber que a vida é feita de opções. É perceber que por vezes é preciso decidir entre os desejos e os deveres - e saber quando escolher o quê. É tomar as rédeas do nosso destino, em vez nos deixarmos enredar por ele. É o glorioso direito da liberdade e o pesado dever da responsabilidade num só embrulho.
Crescer não é abandonar os sonhos ou a infantilidade - isso é envelhecer. Também não é deixar de correr riscos ou aceitar o mundo como é - isso é acomodar. Crescer é mudar o mundo enquanto deixamos que o mundo nos mude a nós, parar de viver num mundo de sonhos para passar a sonhar no mundo em que se vive.
Sobretudo, crescer é difícil. Tem dores de parto - só que é o parturiente que também nasce. Só não morre quem nunca nasceu - e quem nunca cresceu também nunca realmente viveu.
Quanto me custou a mim crescer na altura em que tive que o fazer... e a realidade é que não o trocaria por nada!
Crescer não é abandonar os sonhos ou a infantilidade - isso é envelhecer. Também não é deixar de correr riscos ou aceitar o mundo como é - isso é acomodar. Crescer é mudar o mundo enquanto deixamos que o mundo nos mude a nós, parar de viver num mundo de sonhos para passar a sonhar no mundo em que se vive.
Sobretudo, crescer é difícil. Tem dores de parto - só que é o parturiente que também nasce. Só não morre quem nunca nasceu - e quem nunca cresceu também nunca realmente viveu.
Quanto me custou a mim crescer na altura em que tive que o fazer... e a realidade é que não o trocaria por nada!
Thursday, November 1, 2007
Relembrando velhas pautas
Hoje apeteceu-me dar uma volta pelas velhas pautas.
A certa alturo passo por um estudo de Bach que toquei pela primeira vez há uns 15 anos. Já não devo tocá-lo há vários anos, mas depois de tocar lentamente os primeiros compassos apoiado na pauta, parece que tudo volta - as mãos começam a mexer-se sozinhas - como se estivessem a seguir um ritual complexo, já definitivamente entranhado nos meandros do cérebro. Agora já não é preciso pensar - basta sentir e ouvir o que as mãos têm para contar e cantar. É como se o eu do passado estivesse a falar comigo através destas pautas.
Ele fala-me da minha vida antiga - essa, que já passou e que não voltará mais. Lembra-me de conversas que tive, do dia em que comecei a tocar aquela música, do momento exacto em que comecei a conseguir tocá-la com prazer. Lembra-me da maneira como eu corri para casa para finalmente experimentar aquela outra, enquanto tocava baixo às 2h da manhã para não acordar a família ou os vizinhos. Que bons tempos eram!
Peço-lhe (-me?) para me falar das pessoas desses dias. Ele (eu?) conta-me das pessoas que se lembra, daquela pessoa que gostava muito que eu tocasse esta música, daquela outra que chegou a ouvir-me uma vez a tocar. Por vezes esse velho e jovem conhecido, ao ouvir certa música relembra-me de pessoas que saíram da minha vida ou que já abandonaram a delas - pessoas que já não devo voltar a ver fora destas conversas. Pessoas que estão bem fechadas no cofre da memória, e em cuja fechadura esta pauta entra como uma chave. Ele lembra-me então de conversas, acções, ideias trocadas, vidas vividas e passadas. Por vezes lembra-me de pequenos pormenores que só podem estar de alguma forma escritas no meio dos rabiscos negros no papel amarelecido, porque certamente que já não me poderia lembrar deles.
Fala-me das coisas boas e más, das coisas que tenho saudades e daquelas que não sinto a falta. Dos sonhos desfeitos e dos objectivos atingidos. Relembra-me os meus ideais da altura, dos meus valores, dos meus amigos e conhecidos. Das dores que passei, dos prazeres que vivi.
Enquanto me lembro de como era penso no que sou. (re)Avalio-me - tanto na técnica das mãos como na maneira de viver. Comparo-me comigo próprio - penso em mim com 25, 20, 15 anos, sentado num outro banco a tocar num outro piano e a viver uma outra vida - mas a tocar aquelas mesmas pautas, aquelas mesmas músicas. Como tudo mudou, e como tanta coisa permanece igual! Continuo a gostar imenso desta passagem - continuo a não conseguir tocar aquele compasso como deve de ser, ainda faço os mesmos erros - mas de maneira diferente. Continuo tímido, mas já menos notam. Ainda gosto de matemática, mas já aprendi a gostar do mundo das pessoas. Ainda sou uma pessoa diferente aos olhos dos outros, mas já vivo bem com isso. Já percebi que nunca vou poder ter tudo o que quero, mas ainda bem.
Quantas histórias eu leio nestas pautas. Quantas recordações escondidas nas entrelinhas, quantas mensagens escondidas no meio das notas. É impossível lembrar-me de tudo numa só noite, tal como é não consigo escrever tudo de uma só vez. Teria que viver a minha vida toda outra vez para ter tempo de conseguir tirar toda a informação que está dentro destas caixas poeirentas, para poder sentir de novo todas as emoções entranhadas.
Como é que será que lá cabe tanta coisa dentro?
A certa alturo passo por um estudo de Bach que toquei pela primeira vez há uns 15 anos. Já não devo tocá-lo há vários anos, mas depois de tocar lentamente os primeiros compassos apoiado na pauta, parece que tudo volta - as mãos começam a mexer-se sozinhas - como se estivessem a seguir um ritual complexo, já definitivamente entranhado nos meandros do cérebro. Agora já não é preciso pensar - basta sentir e ouvir o que as mãos têm para contar e cantar. É como se o eu do passado estivesse a falar comigo através destas pautas.
Ele fala-me da minha vida antiga - essa, que já passou e que não voltará mais. Lembra-me de conversas que tive, do dia em que comecei a tocar aquela música, do momento exacto em que comecei a conseguir tocá-la com prazer. Lembra-me da maneira como eu corri para casa para finalmente experimentar aquela outra, enquanto tocava baixo às 2h da manhã para não acordar a família ou os vizinhos. Que bons tempos eram!
Peço-lhe (-me?) para me falar das pessoas desses dias. Ele (eu?) conta-me das pessoas que se lembra, daquela pessoa que gostava muito que eu tocasse esta música, daquela outra que chegou a ouvir-me uma vez a tocar. Por vezes esse velho e jovem conhecido, ao ouvir certa música relembra-me de pessoas que saíram da minha vida ou que já abandonaram a delas - pessoas que já não devo voltar a ver fora destas conversas. Pessoas que estão bem fechadas no cofre da memória, e em cuja fechadura esta pauta entra como uma chave. Ele lembra-me então de conversas, acções, ideias trocadas, vidas vividas e passadas. Por vezes lembra-me de pequenos pormenores que só podem estar de alguma forma escritas no meio dos rabiscos negros no papel amarelecido, porque certamente que já não me poderia lembrar deles.
Fala-me das coisas boas e más, das coisas que tenho saudades e daquelas que não sinto a falta. Dos sonhos desfeitos e dos objectivos atingidos. Relembra-me os meus ideais da altura, dos meus valores, dos meus amigos e conhecidos. Das dores que passei, dos prazeres que vivi.
Enquanto me lembro de como era penso no que sou. (re)Avalio-me - tanto na técnica das mãos como na maneira de viver. Comparo-me comigo próprio - penso em mim com 25, 20, 15 anos, sentado num outro banco a tocar num outro piano e a viver uma outra vida - mas a tocar aquelas mesmas pautas, aquelas mesmas músicas. Como tudo mudou, e como tanta coisa permanece igual! Continuo a gostar imenso desta passagem - continuo a não conseguir tocar aquele compasso como deve de ser, ainda faço os mesmos erros - mas de maneira diferente. Continuo tímido, mas já menos notam. Ainda gosto de matemática, mas já aprendi a gostar do mundo das pessoas. Ainda sou uma pessoa diferente aos olhos dos outros, mas já vivo bem com isso. Já percebi que nunca vou poder ter tudo o que quero, mas ainda bem.
Quantas histórias eu leio nestas pautas. Quantas recordações escondidas nas entrelinhas, quantas mensagens escondidas no meio das notas. É impossível lembrar-me de tudo numa só noite, tal como é não consigo escrever tudo de uma só vez. Teria que viver a minha vida toda outra vez para ter tempo de conseguir tirar toda a informação que está dentro destas caixas poeirentas, para poder sentir de novo todas as emoções entranhadas.
Como é que será que lá cabe tanta coisa dentro?
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