Tuesday, July 10, 2007

Viagens: "tomem lá a chave, volto dentro de uma hora"

Após dois ou três dias de viagem pelo Alasca eu e o meu companheiro de viagem estávamos com um certo.... mau aspecto. Tínhamos passado as últimas duas noites a dormir em parques de campismo à chuva, em terrenos alagados e enlameados, sem sítio para tomar banho. O nosso carro alugado não era propriamente um portento e tinha o mesmo mau aspecto que nós.

Eis que chegamos a uma pequena povoação chamada Homer - um sítio muito bonito rodeado por água, montanhas e verde (bem - esta seria uma boa descrição para quase todo o alasca) - e começamos à procura de um sítio para ficar.
Depois de procurar um pouco chegamos a uma vivenda um pouco isolada - já fora da povoação. Era uma vivenda muito bem arranjada situada na encosta do monte - um sítio com uma vista privilegiada sobre a área circundante.Batemos à porta com algum receio da recepção que duas pessoas com o nosso aspecto teriam num sítio como aqueles. Eu só pensava que se fosse na Europa e aquela casa fosse minha, provavelmente nem sequer abriria a porta.
A senhora que nos abriu a porta mandou-nos logo entrar para vermos o quarto que ela tinha para alugar. Era um quarto muito bem arranjado (num estilo um pouco exagerado e infantil, na minha opinião) - via-se que tinha pertencido ao filho(a) que entretanto tinha saído de casa, e que ela tinha transformado o quarto de forma a poder receber hóspedes.Eu estava a sentir-me mal só de me sentir tão sujo numa casa tão imaculada e tratada com tanto cuidado, mas o verdadeiro choque ainda estava para vir.

Ela levou-nos ao segundo andar onde ficava uma grande sala. Haviam umas portas de vidro na parede que dava para a varanda e que davam uma vista fabulosa. Toda a sala estava cuidadosamente decorada com todos os confortos modernos - não havia dúvida que aquela pessoa morava ali.
Perguntou-nos se queríamos ficar naquela noite, ao que respondemos logo que sim. Eis que então ela se vira e diz: "óptimo, tomem lá a chave de casa. Eu tenho que ir buscar a minha mãe à estação de comboio e volto daqui a uma hora. Se precisarem de alguma coisa sirvam-se, se quiserem liguem a televisão, as toalhas para o banho estão acolá, etc. - e foi assim que ficámos sozinhos numa casa de uma pessoa que não conhecíamos, com a chave de toda a casa e o nosso carro parado à porta. Ela nem sequer nos pediu os passaportes!

No dia seguinte ao pequeno almoço tive mesmo que perguntar se aquele comportamento era normal, ou se ela era simplesmente "diferente". Durante a conversa pareceu-me realmente diferente em relação ao que estava à espera de ver nos estados unidos - uma idealista de esquerda que até já tinha participado em manifestações anti-bush. Durante a conversa (o que vim a confirmar durante a viagem) descobri que existia muita gente assim por aqueles lados - uma espécie de libertários ultra-ecologistas, habituados a viver numa grande comunidade do tamanho de um continente - um choque para quem estava à espera de encontrar eremitas a correr atrás dos ursos com uma espingarda na mão.

E em portugal há pessoas que acham que eu sou estranho por não trancar a porta da rua à noite antes de me ir deitar - viajar é aprender...

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