Em 2010 foi introduzida uma lei que limita o teor de sal no pão.
Os principais argumentos que tenho ouvido a favor desta lei são os seguintes (podem haver outros):
1) Argumento categórico: o estado tem o dever de se preocupar e de trabalhar no sentido de melhorar a saúde dos seus cidadãos.
2) Argumento utilitário: o estado gasta muito dinheiro devido a doenças relacionadas com o consumo excessivo de sal e por isso deve trabalhar no sentido de reduzir esses custos.
O argumento utilitário é muito desinteressante - parece-me uma má razão para criar uma lei deste género mais que não seja porque está fundado em "factos" difíceis de comprovar (e porque o argumento utilitário é frequentemente muito pouco humanista).
Para se fazer as contas ao custo para o estado do excesso de sal não basta contabilizar os custos da saúde - seria preciso calcular os custos/ganhos decorrentes das mudanças nos hábitos de consumo devido a pessoas que passam a comer outros produtos. Se calhar em vez de comer pão as pessoas passariam a consumir outros produtos que lhes fariam ainda pior!
Numa objecção mais cínica e nada politicamente correcta, poder-se-ia argumentar (tal como o fez a Philip Morris no infame estudo de 2001) que o facto de as pessoas morrerem mais cedo devido a complicações relacionadas com o excesso de sal pouparia bastante dinheiro em reformas e pensões da segurança social.
Para mim o cerne da questão está no argumento categórico - o estado deve trabalhar activamente para melhorar a saúde dos cidadãos, mesmo que o faça contra a vontade desses mesmos cidadãos?
Responder que sim é defender uma visão de um estado paternalista e moralista, que acha que as pessoas não são capazes de tomar as decisões mais correctas por si próprias. Para este estado, as pessoas não só têm que ser guiadas e ensinadas, como as possibilidade de terem comportamentos "errados" deve ser controlado e proibido - mesmo que apenas afecte as pessoas em causa, sem prejuízo de terceiros.
Na minha visão libertária, o estado está a ultrapassar os seus deveres, privando os cidadãos de uma escolha - que pode ser consciente ou não. Para mim seria bem mais interessante um modelo em que o teor de sal teria que ser indicado ao consumidor (eventualmente com um código de cores, para simplificação).
O carácter repressivo seria assim substituído por uma medida de carácter informativo, o que estaria mais de acordo com uma visão de um estado que ensina e forma, e não de um estado que proíbe e reprime.
Há que dizer que o artigo do público do primeiro link menciona outros países que têm conseguido resultados com base em recomendações e campanhas - o que parece apontar para algum sucesso da aproximação formativa versus repressiva.
Esta lei pode parecer bastante irrelevante e insignificante, mas segundo o próprio artigo do público os seus autores criaram-na com o objectivo de mais tarde alargá-la a outros produtos. A continuar este caminho, mais cedo ou mais tarde há de haver um produto que é proibido e que não é assim tão irrelevante.
E já agora, porquê ficarmo-nos pelo sal? Eventualmente alguém se haverá de lembrar que o tabaco e o álcool fazem mal à saúde - afinal, ideologicamente não existe diferença entre a lei do pãozinho sem sal e a lei seca dos estados unidos. Evidentemente que os impactos de ambas as leis são completamente diferentes, mas o princípio moralista que está por trás é idêntico.
Finalmente, não deixa de ser curioso constatar que aparentemente (segundo o último parágrafo do artigo do público) é mais fácil e barato proibir do que prevenir e informar.
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