Tenho uma certa facilidade em dividir a minha vida em fases mais ou menos distintas. As diferenças na minha maneira de ser entre essas fases são suficientes para que normalmente lhes chame simplesmente de "vidas", de forma a salientar a importância da transicção.
Uma das alterações que me faz mais confusão de relacionar entre diferentes "vidas" é a minha relação com os cheiros.
Numa "vida" anterior tive uma namorada que me dizia frequentemente que eu tinha anósmia - que é como quem diz, não conseguia identificar cheiros. Olhando para trás realmente tenho que lhe dar alguma (não toda) razão - embora na realidade a minha principal dificuldade fosse em distinguir a marca do perfume que ela usava (o que por vezes me causava ligeiros dissabores, visto que era uma coisa a que ela dava muita importância).
Hoje em dia dou por mim a dar uma grande importância aos cheiros que me rodeiam. Apesar de ainda não conseguir distinguir a marca dos perfumes que passam por mim no dia-a-dia o facto é que noto muito mais os cheiros - e que uso conscientemente essa informação para tirar conclusões.
Sei também quais são os cheiros que gosto ou não gosto particularmente: por exemplo não gosto de cheiro a tabaco, café ou chocolate (por estranho que possa parecer) e delicio-me com cheiro a laranja, a flores e polen (ao qual sou infelizmente alérgico) - recentemente o cheiro das tílias e das jacarandas do bairro alto quase que me fez querer dormir na rua. Se não fosse a minha alergia acho que me dedicaria rotineiramente a orgias olfactivas (frequentemente mudo o meu caminho apenas para poder passar por um sítio que cheire a pólen).
Existem também alguns cheiros que têm um significado especial para mim. Alguns cheiros fazem-me lembrar algumas pessoas, outros fazem-me lembrar sítios onde estive. É frequente um cheiro activar memórias antigas, o que me leva normalmente a uma certa nostalgia.
Um conjunto de cheiros que me lembro particularmente bem são os cheiros de quando jogava hoquei. Lembro-me perfeitamente que no princípio dos treinos o pavilhão cheirava a cera - e se os treinos fossem de dia o cheiro era particularmente forte por causa do calor e do sol que entravam pelas janelas do pavilhão. Quando começávamos a patinar o som dos rolamentos começava a ecoar pelo pavilhão deserto e começava a sentir-se o cheiro a óleo e massa consistente das rodas. Quando o treino já ia avançado começava a cheirar a borracha queimada das travagens e mudanças de direcção, e as luvas começavam a cheirar a suor. Depois do treino era o cheiro das toalhas molhadas do duche, o cheiro (muito característico - e não, não era cholé) das botas dos patins e o cheiro a suor de todo o equipamento que estava em contacto com o corpo.
É engraçado que por exemplo o squash não tem cheiro - é inodoro, asséptico - a única excepção é a bola, que frequentemente cheira a borracha aquecida (mas apenas se a puser perto do nariz, um sítio onde é esperado que a bola não passe muito tempo num jogo civilizado).
No ténis de mesa o cheiro predominante é o cheiro da cola da raquete, mas que normalmente se perde um bocado quando o recinto de jogo é muito grande.
Apesar de dar esta importância aos cheiros e de frequentemente ser capaz de identificar uma pessoa pelo cheiro, hoje em dia não costumo usar perfume. Limito-me a usar desodorizante (não suporto cheirar mal - é algo que me faz ir a correr envergonhado para casa tomar um duche). Não sei porque é que deixei de usar, mas o facto é que durante esta última "vida" ofereci-os todos...
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